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Há algumas semanas terminei de ler “A Idiota”, da Elif Batuman, e não sei dizer se gostei ou não da leitura.
Já aconteceu com você? De terminar um livro e pensar, “isso aqui entra ou não na caixinha das boas histórias?”
Tive uma sensação parecida depois de ler “Conversa Entre Amigos”, da Sally Rooney. Nesse caso a coisa foi ainda mais estranha, porque depois de ter lido (e amado) “Pessoas Normais”, estava certa de que iria adorar “Conversa Entre Amigos”. Mas não foi bem assim.
Esses dois livros me deixaram com um gosto estranho na boca, um certo sabor de que faltou algo. Foram suficientemente cativantes pra que eu não parasse de ler, isso é verdade. Virei página atrás de página pensando, “será que agora vai?” Mas a sensação que ficou é a de que nunca engatou.
Ambos livros possuem coisas em comum: são histórias centradas em protagonistas mulheres, jovens, que estão naquela fase em que não sabem exatamente o que querem ser ou fazer da vida. Been there, done that. Mas não consegui me identificar 100% com a Selin de “A Idiota” ou a Frances de “Conversa”. Eu também fui uma jovem perdida de 20 e poucos anos, sim. Mas nunca tive o grau de indecisão dessas duas. E tamanha indecisão talvez seja o que faça com que suas histórias sejam mais sobre o que poderia ter acontecido e menos sobre acontecimentos em si.
O que poderia ter sido se a Selin dissesse o que sente para o Ivan?
O que poderia ter sido se ela se abrisse de verdade com sua mãe?
O que poderia ter sido se ela falasse o que realmente pensa sobre suas aulas?
Muitos “e se…”
Há pouco tempo li uma news da
que define bem a trama de “A Idiota”: é uma história onde não acontece nada. Inclusive esse texto foi o que me motivou a comprar e ler o livro.Como assim não acontece nada?
Pois é. Não há um grande conflito. Não há um grande desenlace. A jornada do herói, ou heroína nesse caso, não acontece da forma como estamos acostumados. Acompanhamos o dia a dia da Selin, suas idas e vindas, seus dramas de primeiro amor, suas amizades e classes da universidade, o que por si só já daria muito pano pra manga. Mas a forma como a autora relata a história, ou a forma como a personagem vive o relato, não entrega ação. Não sentimos que estamos indo a algum lugar com a história, tudo parece um simples passar de horas e dias e meses. No final das contas, terminei a leitura coçando a cabeça, meio incrédula. A sensação que fica no final é de que nada aconteceu.
Conversando com algumas colegas escritoras, percebi que essa escrita do cotidiano 100% comum e real, sem incidentes e até mesmo sem graça, é uma vertente da literatura que sem dúvida possui seus fãs. Afinal de contas, todos somos um pouco Selin. Todos temos momentos (e até diria que é a maior parte da vida) em que nada grande está ocorrendo. Simplesmente vivemos um dia após o outro, lidando com as nossas penúrias, tentando entender o que queremos da vida. Todos passamos por momentos de seguir em frente, de mesmice, de nadas. Quem disse que não queremos celebrar nossas vidas por meio de livros que representam exatamente como elas são?
No meu caso, continuo refletindo se gostei ou não dessa história. Sem dúvida me deu muito pra pensar, e gosto de livros que me surpreendem, que me levam à reflexão. Mas também gosto muito de livros que me tiram da minha realidade, que me transportam pra mundos fantásticos, com grandes plot twists. Gosto de livros que me emocionam, que me fazem rir, chorar, irritar-me.
Não sei se recomendo “A Idiota”. Na minha opinião, não é uma leitura que vai mover sua estrutura e mexer contigo de uma forma profunda. Ou talvez sim. Talvez tudo que você esteja precisando nesse momento seja uma história mais passiva, sem grandes UAUs e reviravoltas. Talvez livros como esse venham bem quando somente queremos nos reconhecer na história e saber que não somente nós temos dias sem muito pra contar.
Bora pra Bienal?
No dia 15 de setembro, domingo, vou estar na Bienal do Livro de São Paulo pra trocar uma ideia sobre meu livro “Mulheres que não eram somente vítimas”. Se você estiver por lá também, vem dar um oi! Estaremos no estande da Livraria Diversa com a editora Folheando e muitas outras editoras independentes do país, das 11h às 12h.
Regie, eu gostei de A Idiota, mas entendo o seu ponto, realmente é uma leitura sem margem a muitas conclusões. Li ou ouvi em algum lugar que tem uma continuação da história de Selim, mas se for o mesmo calhamaço que o primeiro eu acho que não animo muito de ler não. Hahaha
Um beijo.
Regie, não li esse livro, mas sua experiência com ele me lembrou o que eu senti lendo Brancura, do Jon Fosse.